Só escrevo se o poema sair do silêncio.
Só escreverei um poema
se ele vier do silêncio,
se ele surgir feito uma serpente
num bote surpreendente,
feito um felino sorrateiro
que espreita na tocaia
e salta na hora certa.
Não escreverei sentimentalismo de fracassado,
nem me entrego ao cigarro ou a bebida,
não, só escrevo se o poema sair do silêncio.
Nessa minha espiritualidade particular;
sem igreja, nem uma seita ou fraternidade
o que importa é o silêncio.
O silêncio é o fogo do espírito,
o Ser mora no silêncio;
os pensamentos são fumaças, são cinzas
que nada acrescentam,
a não ser a morte e a doença.
Em minha mesa não há copos, garrafas ou cinza de cigarro,
eu me suporto, valorosamente, me suporto.
Não sou isso, não sou aquilo,
apenas faço isso ou aquilo,
Ser é outra coisa muito intima e silenciosa.
J. Nunes